quinta-feira, 7 de abril de 2011

Em um Mundo Melhor

É assim que as guerras começam", diz o pai depois de buscar na escola o filho que caiu na provocação do bully. Isso que parece uma caricatura de sermão - as reações sempre exageradas dos adultos - no cinema da diretora dinamarquesa Susanne Bier é perfeitamente normal. Para ela, as guerras de fato começam assim.


E a guerra virou uma obsessão. Recentemente, Bier tocou no assunto de forma mais direta em Brothers, e hoje, assaltada por uma grandiloquência (ou uma culpa burguesa), ela parece não conseguir mais fazer pequenos melodramas sem antes contextualizá-los geopoliticamente. Mais do que nunca, há algo de podre no reino da Dinamarca. A consciência tem pesado.

Em um Mundo Melhor parte, assim como Depois do Casamento, de uma cena terceiro-mundista para só depois ambientar a trama na Europa. Estamos em uma nação africana em guerra civil, onde o médico sem fronteiras sueco Anton (Mikael Persbrandt) tenta salvar meninas esfaqueadas e violentadas pela facção criminosa dominante. Anton, como bom médico, não julga as pessoas que atende - não lhe cabe fazer justiça.

Mas Anton se vê diante de uma situação delicada quando, de volta para a sua casa, na Dinamarca, descobre que o seu filho e o novo amigo dele se vingaram do bully do colégio de forma agressiva. Dizer que violência só gera violência não basta, e posar de bom moço que dá a outra face também não adianta. As crianças estão decididas a consumar, também em outros aspectos do seu dia a dia, essa descoberta satisfação de revidar.

Como Susanne Bier nunca foi uma diretora de meias palavras, perdoa-se o seu exagero quase irresponsável de comparar a realidade cruel de um fim de mundo africano com as questões rotineiras dos belos loiros suecos e dinamarqueses. O que torna Em um Mundo Melhor insuportável não são as cenas na África, mas a tentativa constante de enxergar em tudo aquilo que se move na Europa sintomas das doenças gerais da humanidade.

Então, no filme, se a avó do garoto diz inocentemente que "já instalamos internet no seu quarto", ferrou. Internet é a porta do mal. Se o avô guardava fogos de artifício no galpão, boa coisa não há de vir. Se os pais se separam, é um futuro apocalíptico que espera qualquer criança. E se as crianças gostam de passar a tarde no terraço de um edifício precário, então daí já viu. Em um Mundo Melhor é o filme da vida de quem decide educar os filhos em casa e não na escola. Em casa tudo é fotografia saturada, espreguiçadeiras à beira do lago e muitos abraços paternais.

Se pretendia colocar os seus personagens em um contexto complexo, e dar conta dos dramas mais variados, como o luto ou a rixa entre nações, o filme só consegue isolar e esvaziar esses personagens e esses dramas. O medo venceu, enfim. O mal-estar de Susanne Bier com o mundo entra em metástase.

resenha Resenha por Miguel Barbieri Jr:por Miguel Barbieri Jr:
O arrebatador drama dinamarquês faturou, merecidamente, o Oscar 2011 de melhor filme estrangeiro. Foi a consagração da diretora Susanne Bier, badalada por irregulares trabalhos anteriores como "Brothers" (2004) e "Depois do Casamento" (2006). A cineasta monta aqui um painel capaz de provocar empatia imediata na plateia ao discutir vários temas sem perder o fio da meada nem tecer julgamentos morais. Num campo de refugiados na África, o médico sueco Anton (Mikael Persbrandt) convive diariamente com o horror da guerra civil. Em uma cidade da Dinamarca, seu filho passa por situação igualmente triste e cruel: é vítima de bullying na escola por causa de sua origem e da frágil aparência. Seu novo companheiro de colégio vai, porém, salvá-lo dos inimigos brutos agindo de uma forma inesperada. Para não estragar as surpresas, não dá para ir além nessa trama bastante atual, pontuada por momentos tão desconfortantes quanto oportunos. Desde já, um dos grandes lançamentos do ano. Estreou em 11/03/2011.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.